Eduardo Galeano, escritor uruguaio que tanto soube compreender as raízes desse povo latino americano que somos, deixou uma bibliografia extensa, e principalmente, com lições para a posteridade. Dentre elas, destaco:

“Dos medos nascem as coragens. Os sonhos anunciam outra realidade possível, e os delírios, outra razão. Somos o que fazemos para transformar o que somos.”

Se “dos medos nascem as coragens”, com o passar do tempo e dos anos, sociedades anestesiadas como a nossa, brasileira, parecem não sentir mais medo. Não porque não existam mais os perigos e as ameaças individuais ou coletivas. Mas porque é mais fácil fingir não ter medo trancados atrás de muros e grades reais ou psicológicas.

E por disfarçar o medo, já não há espaço para a coragem. A coragem para enfrentar os erros, as afrontas, as discriminações, as injustiças, a violência!

E já não escutamos as vozes e não encontramos quem lute. Apenas um ou outro Dom Quixote a enfrentar moinhos de vento.

“Os sonhos anunciam outra realidade possível, e os delírios, outra razão”, mas como fazer isso se a anestesia é geral e não “local”, afinal, não vale só para os medos. Somos corpos paralisados, inertes diante da realidade impossível.

Os sonhos ficam soterrados e não há outra realidade possível quando acordamos e não lembramos mais o que sonhamos ou vamos dormir sem motivo para sonhar.

E os delírios, esses sonhos loucos que alguns conseguem ter acordados e que poucos compreendem, ficam também restritos a um ou outro Dom Quixote que consegue caminhar junto a um fiel escudeiro como Sancho Pança.

Mas, fato é que “somos o que fazemos para transformar o que somos”, e essa força interior só poderá emergir quando o torpor dos anestésicos diários deixar de correr nas nossas veias. Quando percebermos que a realidade pode nos colocar moinhos de vento à frente e cabe a cada um querer enfrentar ou não.

A política e a vida colocaram obstáculos e medos diante de um gigante. Ele poderia ter tomado os anestésicos reais e imaginários e se entregar, acreditando que poderia ser uma luta em vão. E que ele morreria no final, lutando ou não.

Mas preferiu lutar. Porque maior que o peso da morte, foi o peso do exemplo. E isso, nem o tempo e nem a morte poderão apagar.

Em memória do amigo e político Bruno Covas.